Entre arte e ciência
Bruna Guzzo
Como a tecnologia trouxe novas perspectivas para um artista em constante evolução
Jhonnathan Pool Ferreira estava em seu ambiente de trabalho, um espaço maker (espaço de criação tecnológica), lugar onde o som que preenchia o ambiente não vinha das máquinas, mas de uma música desconhecida que tocava suavemente no notebook. Os estagiários, focados, seguiam as tarefas que ele delegava com uma tranquilidade natural. Acomodado em uma cadeira, de frente para o computador, montava alguns chaveiros 3D. Cercado por peças impressas e protótipos, ele começou a compartilhar sua história. Não como um herói ou gênio, mas como alguém em contínua transformação, que encontrou na tecnologia uma aliada para dar forma ao desejo de compreender e moldar o mundo à sua volta.
Nascido e criado em Guarapuava, Jhonnathan Ferreira é formado em História, Geografia e Pedagogia. É artesão e fez cursos na área da arte, como desenho técnico, modelagem e stop motion. Também é maker 3D, programador e técnico em eletromecânica. Cresceu assistindo programas no Discovery Channel e History Channel, é apaixonado por paleontologia e arqueologia. "Eu adorava paleontologia, mas também ficava encantado com ficção científica," ele conta. Filmes como De Volta para o Futuro, RoboCop e O Exterminador do Futuro abriram espaço em sua imaginação, alimentando o desejo de entender e, quem sabe, até criar as "máquinas do futuro".
Ao mesmo tempo, ele sempre estava envolvido com o passado, desenhando cenas históricas. Durante a faculdade de História, ao se aprofundar na pesquisa acadêmica, Jhonnathan encontrou novas formas de se expressar. Ele se envolveu com a criação de monumentos locais, como a escultura de Mahatma Gandhi e figuras ucranianas, obras que se tornaram lugares da memória coletiva de Guarapuava. Esse trabalho o conecta a algo maior do que ele mesmo, uma forma de imortalizar a história.
Esse interesse inicial pela arte e pela ciência nunca o abandonou, mas ganhou uma nova perspectiva quando a tecnologia entrou em sua vida. “Eu tinha medo de que as máquinas substituíssem a mão humana,” confessa. Porém, o que ele encontrou foi algo diferente, uma parceria inesperada entre o que é humano e o que é tecnológico, uma aliança que redireciona seus limites criativos. A máquina, como o robô Honda P2 que tanto o fascinou na infância, não era um rival, mas uma colaboradora.
Durante a conversa, o tom da voz de Jhonnathan denotava o sentimento de alguém que viveu tanto dores quanto conquistas. Desenhar, para ele, sempre foi uma forma de escapar, de se conectar com algo maior quando faltavam as palavras. "Eu me isolava no papel", ele diz, sem qualquer tentativa de encobrir a verdade. A arte foi o abrigo, uma maneira de processar emoções e experiências. Ao crescer, o abrigo se expandiu, da folha de papel para o mundo físico das impressoras 3D, onde suas ideias ganham vida. A resistência inicial que sentia em relação à tecnologia tornou-se o estímulo de uma revolução pessoal. "A desconfiança virou curiosidade," comenta.
Um talento que se tornou uma missão
A conversa se aprofunda quando Jhonnathan fala sobre a perda do pai, um evento que o marcou profundamente. "Quando ele ficou doente, eu me senti impotente," relembra, com a voz carregada de emoção. Sentado à frente do computador, ele parecia reviver aqueles momentos, tentando fazer as pazes com essa sensação de impotência. "Aquilo que eu não pude fazer por ele, eu quero fazer pelos outros," diz ele, explicando que seu interesse pela criação de crânios em 3D nasceu dessa vontade de ajudar. Através do estudo da anatomia e da impressão 3D, Jhonnathan vê uma forma de impactar a área médica, oferecendo ferramentas que possam auxiliar médicos e profissionais de saúde a entender e tratar melhor o corpo humano. O que antes era apenas um interesse técnico tornou-se uma missão pessoal, uma maneira de transformar a dor e a perda em algo útil, real e que possa trazer alívio a outras famílias.

Dr. Lucas Brandão e Jhonnathan Ferreira apresentam o crânio impresso em 3D, união da ciência médica com a inovação tecnológica. Foto: Bruna Guzzo
Os estagiários, à sua volta, escutam e entendem mais do que instruções técnicas. Eles aprendem como Jhonnathan trabalha, mas também como ele lida com o processo criativo, com paciência e aceitação. O espaço maker reflete esse estado de espírito, uma oficina de experimentação, onde o erro é tão bem-vindo quanto o acerto. Ele entende que o processo criativo, assim como a vida, é feito de constantes mudanças e adaptações, sem um ponto final claro.
Ao olhar e lembrar das suas criações, espalhadas pelo espaço e pela cidade de Guarapuava, é possível perceber que Jhonnathan não se encaixa em um único rótulo. Ele não é apenas um artista, nem apenas um técnico, é um pouco de ambos e, ao mesmo tempo, algo mais. A aliança entre a arte tradicional e a tecnologia que ele explora em seus projetos não tem como objetivo criar algo perfeito, ela abre novas possibilidades, expande os limites do que é possível e, ao mesmo tempo, permite que ele se reconecte com partes de si mesmo que talvez tivesse perdido ao longo do caminho.
Quando a entrevista chega ao fim, ele volta a ouvir música e ajustar as impressoras. Fica claro que sua história não é sobre a busca por um ideal impossível. Assim como as máquinas que ele opera, Jhonnathan está em constante transformação, se reinventando a cada passo. Ele não busca ser definido por um único papel ou título, e talvez essa seja sua maior força. Ao final, sua jornada é profundamente humana, marcada pelo desejo de criar, de entender o mundo à sua volta e de seguir adiante, sempre em movimento, sempre em busca.

Acompanhe o processo de impressão 3D do crânio, onde tecnologia de ponta transforma ideias em realidade. Vídeo: Ana Laura Becker
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Obras feitas na cidade de Guarapuava por Jhonnathan Ferreira. Fotos: Arquivo pessoal


