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Bruna Carolina Guzzo e Heloisa Zolinger

Além do limite do cartão: quando os delírios de consumo se tornam um pesadelo

As compras compulsivas são um problema cada vez mais comum. Entenda as causas e saiba como identificar esse transtorno

“Quando eu olhava para as vitrines, via outro mundo. Cheio de sonhos, repleto de coisas perfeitas, onde as meninas crescidas compravam o que queriam. Eram lindas como fadas e princesas. Nem precisavam de dinheiro, tinham cartões mágicos”. 

              A frase inicial do longa-metragem Os Delírios de Consumo de Becky Bloom (2009) destaca um universo onde o desejo, a magia e a beleza eram alcançados por meio do consumo. Afinal, quem nunca se viu hipnotizado pela vitrine, sonhando com um mundo onde a felicidade se encontra nas compras? 

              Dirigida pelo cineasta P.J. Hogan, a comédia romântica, baseada no livro homônimo de Sophie Kinsella, retrata de forma divertida e descontraída os desafios enfrentados pelo vício em compras. Rebecca Bloomwood (Isla Fisher), Becky, além de vivenciar seus “delirantes momentos de consumo”, se torna uma espelho que reflete uma sociedade marcada pela busca incessante por bens materiais.   

              Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que cerca de 8% da população mundial sofre com a compulsão por compras. Deste número, entre 80% e 94% dos compradores compulsivos são mulheres, cujo transtorno costuma surgir por volta dos 18 anos, segundo uma pesquisa publicada na Revista Brasileira de Psiquiatria. As causas desse comportamento compulsivo são complexas e podem envolver fatores psicológicos, sociais e culturais. 

               Apesar da similaridade, nem todos que gostam de comprar,  ou que realizam compras por impulso, são diagnosticados com esse distúrbio. O consumismo e o consumo compulsivo são termos frequentemente utilizados de forma correlacionada, mas possuem características importantes que o diferenciam. Embora ambos envolvam a aquisição de bens, as motivações e os impactos são distintos. O problema é quando a vontade de comprar se torna uma compulsão.

               De acordo com o professor do Departamento de Economia da Unicentro, Ricardo Cifuentes, o consumismo é o elemento fundamental do sistema econômico vigente, já que, sem consumo, não há reprodução do capital e, consequentemente, não há lucro. “É necessário estimular o consumo para que eu possa vender as mercadorias que eu produzi e poder realizar o lucro que eu criei durante o processo de produção. Então, o consumismo é um elemento fundamental, diria eu, um dos elementos estruturantes do sistema econômico que a gente vive, que é o capitalismo”, ressalta. 

               Por meio do sistema econômico, é possível encontrar um estímulo ao consumismo e, inclusive, um incentivo ao consumo de maneira compulsiva. Uma vez que, para vender, é preciso diferenciar as mercadorias para atingir novos públicos. E, portanto, despertar o desejo de consumo em cima dessas pessoas. Assim como ocorre no filme, em que Becky é seduzida pelos diversos tipos de produtos, os quais não precisa, mas acaba comprando devido ao impulso.

               O docente explica que existem outras formas de organização social em que não ocorre isso. Em países orientais com matrizes distintas, por exemplo, as sociedades valorizam outros aspectos da vida, como as relações interpessoais e a espiritualidade. Isso permite criar produtos que vão além da simples satisfação de desejos materiais, buscando atender necessidades reais. “Existem várias linhas de críticas ao poder capitalista que questionam se o desejo é uma falta ou se você produz artificialmente essa falta, criando o desejo e estimulando o consumo. Todas as estratégias para a diminuição do consumo passam por uma questão extra-econômica, que motiva você a questionar o que está provocando o consumo, se aquele consumo é realmente necessário e outras formas de você poder suprir esse consumo”, complementa Ricardo. 

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O economista Ricardo Cifuentes fala sobre o que motiva o consumo. Foto: Heloisa Zolinger

               Por outro lado, no caso do comprador compulsivo, há o gasto em excesso porque se procura tratar uma questão emocional com algo concreto. Segundo a psicóloga Isabela Edling, a condição está muito atrelada a quadros de ansiedade e depressão. No tratamento, através da teoria cognitivo-comportamental, o psicólogo procura modificar os padrões de comportamento e pensamentos disfuncionais, buscando melhorar a qualidade de vida do paciente. “O consumo compulsivo vem de padrões recorrentes e incontroláveis, buscando aliviar sentimentos negativos, como o estresse, a raiva, o medo e a tristeza. A pessoa que tem o consumo compulsivo, ela vem como um sentimento de alívio, mas logo após isso vem o sentimento de frustração, da dor de ter comprado”.

               Confira mais na segunda parte da reportagem no link abaixo:

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